“Produto manual é caro por causa
das pessoas”
Olá
leitores, sei que estou em falta com o blog, passei meio apertado esses dias
com outros compromissos, porém voltei para o post de hoje, era para eu ter
postado semana passada, porém surgiu o Line Up da SPFW então dei uma aguardada,
pois esse tema é muito interessante, mais recentemente nesse mês a umas duas
semanas atrás tive a oportunidade de ir com uma amiga minha na III Feira Têxtil
da Faculdade Santa Marcelina onde assisti a uma palestra de Raquell Guimarães
proprietária da Doisélles desenho em tricô.
Eu
não conhecia o trabalho dessa jovem designer, porém me apaixonei na 1° vista,
primeiro por ela ser uma graça de pessoa e segundo por ela fazer um trabalho de
inclusão social com detentos de presídios em minas gerais, mas vamos do começo,
essa mineira que tricota e faz crochê desde a infância esteve na indústria da
moda desde cedo por causa de seu pai proprietário de uma malharia e tecelagem,
portanto a escolha de Raquell por essa área foi muito natural já que ela estava
no caminho, depois de formada sua coleção de conclusão de curso toda em tricô
chamou a atenção da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (ABIT) que
convidou a designer para uma clínica de produto, pois o que ela apresentava era
diferenciado e autoral.
Três meses após essa clínica a ABIT a enviou para
a feira Who’s Next em Paris onde todo ano são lançados novos talentos no ramo
da moda, posteriormente essa feira com um boleto de pedidos cheios aconteceu um
impasse já que a designer em ascensão tinha que decidir em qual nicho seu
produto estava conectado se era em escala industrial ou manual, nesse momento
ela decidiu conectar o seu tricô a uma esfera mais artística e conceitual
evitando assim um embate com as fábricas chinesas e seu preço extremamente
baixo. Nesse período da palestra foi que Raquell justificou o porquê de ter
envergado nesse caminho e o porquê de suas peças serem caras segundo ela “O
produto manual é caro por causa das pessoas, pois ela se dá para criação”.
Uma roupa como a dela feita toda manualmente demora três dias para ser
realizada enquanto uma indústria faz em um dia trezentas peças de tricô através
de maquinário, depois de feitas as escolhas e com o talão cheio de pedidos vamos
fabricar?
Esse
foi o objetivo dela para atender os pedidos, no início era uma confecção bem
caseira onde sua mãe a auxiliava costurando, porém com o excesso de pedidos
ela precisou procurar mão de obra externa que daria conta dos pedidos, isso não
foi fácil pois essa ciência é passada de mãe para filha e por ser algo que já
foi comum as pessoas que realizavam muitas vezes eram idosas e aposentadas
portanto não havia mão de obra disponível, foi ai que Raquell pensou em treinar pessoas pois ela sabia e se
precisava de mão de obra por que não ensinar? Para isso ela foi até uma
penitenciária onde inicialmente ela cogitava aplicar esse projeto para as
mulheres que estavam nesse local.
Porém
não foi isso que ocorreu por causa da lotação no bloco feminino Raquell foi
desenvolver esse projeto no bloco masculino, é estranho pensar em homens
tricotando não é? Mas ela conseguiu
educar os rapazes e hoje eles se orgulham em estarem fabricando peças que
aparecem nas novelas e em ensaios de moda em revistas, porém a escolha deles
não foi ao acaso já que dentro da penitenciaria já existia um núcleo de
fabricação de tapetes artesanais, portanto não foi difícil ela explicar a eles
as receitas para fazer tricô mas ao mesmo tempo ela os incentivou a terminarem
os estudos e se graduarem no ensino médio e fundamental. Com esse projeto
instalado houve outra dúvida como seria feito o pagamento? Por remissão de pena
ou em dinheiro? Raquell propôs um pagamento acima do piso da LEP (Lei de
execuções penais) que é de dois quartos de um salário mínimo, onde os presos
seriam remunerados por produção tal qual ocorre em alguns estabelecimentos comerciais.
Esse
trabalho desenvolvido é tão incrível que a própria designer fez um documentário
chamado cadeia de produção exibido na ocasião da palestra, onde mescla
testemunhos de detentos e dos profissionais que trabalham na penitenciária,
nesse documentário aparecem os detentos trabalhando de luvas, toucas e máscaras
para proteger a saúde além de evitar que fios de cabelo, por exemplo, caiam nos
fios de tricô.
Após
a exibição foi aberta a rodada de perguntas, entre elas destaco uma em especial
que falava do DNA da moda da Doisélles, Raquell afirmou que a marca procura ir
contra a ideia de que o artesanal tem que ser necessariamente regionalista para
a marca não existe isso já que a roupa tem que ser universal. E a qualidade é
um luxo atual, portanto é isso que a marca transmite através de pequenos
detalhes como acabamento. Ouve também outra questão sobre como a designer
encarava a criação, para ela a criação é nada mais nada menos que uma ponte em
constante trânsito de ideias e desejos.
Além
disso, para Raquell o trabalho que ela desenvolve com a população carcerária
tem um poder transformador por evita que essas pessoas voltem a cometer delitos
deixo aqui uma frase que sintetiza toda a explanação dela:
“Se o Privado se unir ao público é
possível montar uma sociedade mais justa” Raquell Guimarães, Outubro de 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário